terça-feira, abril 30, 2013

ANTOLOGIA 101








  

 Isabel Cristina Silva Vargas 

Pelotas / RS






Mútuo amor








Viveu sem teto, livremente,
Tal qual andarilho.
Sua índole lhe valeu companhia:
Dois fiéis companheiros.
De infortúnio, diriam alguns,
De viagem, outros mais espiritualizados.
Amigos de todas as horas,
Com quem dividia comida, água,
Local de repouso e guarida.
Inseparáveis, conquistaram amigos humanos
Com coração assim como os seus
Que muitos classificam não humanos.
Que a eles se dedicaram
Com amor imensurável,
Eles, alegres e fielmente retribuíram.
Três amigos inseparáveis.
Até que um deles sucumbiu na estrada,
Atingido pela insensatez humana.
Hoje, choram por ele,
Seus companheiros e, nós,
As famílias que os adotaram
E o acompanharam até seu derradeiro sopro.







ANTOLOGIA 101

VERSOS REPLETOS NA NOITE VAZIA



 

 Isabel Cristina Silva Vargas

Pelotas / RS



Saudade



Saudade do olhar
Que encantou o meu
Revelando imenso mar
De desejos e incertezas
Sobre o futuro, na época, incerto.

Saudade dos sonhos
Que com amor tornamos realidade
Para viver em harmonia
Comunhão total.

Saudade do tempo
Dos filhos pequenos
Da longa estrada a percorrer.
Sem medo dos imprevistos.

Saudade de tua mão na minha
A me apontar caminhos
Que juntos percorremos.

Saudade de tua companhia
Do nosso amor...

Saudade de ti
Que trilhas novos caminhos
Em outra dimensão.





(Para Francisco)


CONTOS DE OUTONO 2013




  
 Isabel Cristina Silva Vargas 
Pelotas / RS



Ninho vazio




Ela deitada na rede no alpendre da casa parecia estar em completo relaxamento, gozando as delícias do momento, sem compromisso, sem perturbação aparente. Quem a visse diria estar em sintonia com o ambiente que a cercava. Praia, tranquilidade, brisa suave a soprar no início de outono de temperatura amena. Animais de estimação descansando a seus pés parecendo todos integrados em perfeita harmonia.
Seus pensamentos, entretanto, não condiziam com a aparência, pois as dúvidas a perturbavam. A incerteza era sua companheira. Começava uma nova etapa de sua vida. Nunca pensou que chegaria tão rápido. Parece que fazia tão pouco tempo que haviam se conhecido, namorado, casado. O ciclo, entretanto já se havia completado. Casamento, filhos pequenos, correria para trabalhar, acompanhar seu crescimento, vivenciar com intensidade todas as etapas da vida de cada um. E, eram quatro. Trabalho e satisfações intensas. Alegrias, surpresas. Alvoroço de família reunida. Avós ao redor da mesa, risadas, alegrias eternizadas em centenas de fotos espalhadas em inúmeros álbuns em uma ânsia de guardar estes momentos como se assim fazendo durassem para sempre.
As crianças cresceram, os idosos se foram, Outro ciclo começou. Namoro, noivado casamento. A primeira neta. Recomeço com sabor de doçura duplicada. Novos encantamentos. Tudo em ritmo de festa. 
A perda dos avós, embora sentida fazia parte de um ciclo natural.
Então, inesperadamente, brutalmente, ela diria o ciclo foi rompido e o filho caçula, com toda vitalidade, teve a vida ceifada. O caos se instalou. Pensou na sobreviver. Sobreviveu.
Embora se sentindo mutilada, seguiu vivendo. Nunca pensou que teria forças para tal. Talvez fruto de sua eterna teimosia. Nunca se deixou abater com as dificuldades. Não via opção senão lutar e ir em frente. Não se deixava vencer.
Quando pensava estar se acomodando a esta nova realidade eis que a vida lhe passa outra rasteira. Agora, o marido sucumbe. A enfermidade vence. Ele junta-se ao filho.
E ela? Qual será seu novo caminho? Como enfrentará o ninho vazio? Terá forças para seguir sozinha? Todas estas indagações povoam seus pensamentos. Tudo passou tão rápido...
Um filme passa em sua mente. Nem parece que se passaram quarenta anos. O ciclo segue avassalador.